I. puro suco de Brasil
Já vivi em muita rua desse Brasil e posso afirmar que cada uma tem sua natureza. Particularmente me atraem as ruas longas, pouco acessíveis e de um verde imenso. Também dou preferência às que possuem vizinhos de idade avançada. São particularmente mais respeitosos. Se tem uma coisa que prezo neste mundo é o silêncio.
Vários fatores contribuem para que as ruas brasileiras sejam especialmente barulhentas. Construções em atividade de domingo a domingo, crianças e seus escândalos por vezes incompreensíveis, a comunicação entre cachorros de todos os tipos, gatos transando escandalosamente pelos telhados, fogos de artifícios antes das 6h da manhã, vizinhos de sotaque sergipano com vozes estridentes, e claro, a poluição sonora dos repertórios de traição, exaltação a monogamia e depreciação da mulher. Clássicos brasileiros!
Agora mesmo estou vivendo numa ruazinha ordinária. Infelizmente a querida não possui nenhuma das características que valoro, muito pelo contrário. Aquela dos tipos clássicos, se é que você me entende.
Vivi um ano na Argentina e adivinha? A vizinha do som alto era eu! Fiquei chocada com essa constatação, mas logo fui dosando a mãozinha no volume, afinal, às vezes nem a gente mesmo olha para o próprio nariz, imagine.
II. bonitinha, mas ordinária
Mas voltando a ruazinha ordinária, desta onde vos escrevo, há dias em que eu simplesmente me empenho em clamar por chuva. Em 28 anos de pesquisa empírica, percebi que a chuva é um sinônimo de paz para a poluição sonora. Sem dúvida também é sinônimo de desespero para muitas outras questões como deslizamentos, perdas materiais e vidas humanas entre tantas outras coisas que, para as pessoas da periferia, são a sua vida inteira.
Agora mesmo chove. Recebi alertas climáticos que afirmam que choverá até o dia seguinte e só por isso consigo escrever. Coincido de viver no primeiro andar de um recinto no qual duas casas compartilham um espaço de respiro. A inquilina bonitinha posiciona a caixa de som justo para o tal do respiro e tem momentos (grande parte deles) que só quero sair correndo para meu sonho de utopia no meio do mato.
Mas essa nem de longe é a pior das experiências que já passei. Carnaval, tive o desprazer de viver em Atalaia Nova para nunca mais na minha vida. Tampouco desejo estragar o dia de vocês com tal relato. Acontece que a música alta é capaz de suspender, por um instante de seja, pensamentos, situações e momentos que não queremos ou não sabemos lidar. Dentre tantas possibilidades, um escape.
III. a saída é meter o louco!
Acontece também que na periferia das cidades, a influência do consumo musical se aproxima da homogeneidade. São vários os questionamentos que me faço, mas se a gente pensa um pouquinho, as narrativas que ouvimos constantemente moldam a vida de populações inteiras.
Canções que incitam o consumo exacerbado de álcool, o desrespeito a liberdade da mulher, as milhões e milhões e milhões de notas musicais embaladas na exaltação de amores nocivos, na hipersexualização das "novinhas" que ainda estão brincando com as bonecas que acabaram de parir…
A mesma rua que desaba em chuva nesse exato momento, além de ordinária tem dupla personalidade. Uns chamam de D, outros de C, outros de Luiz Gonzaga. Nenhum Uber consegue chegar na porta, nenhum posto de saúde identifica sua localização e até mesmo as encomendas vão parar em outro endereço.
Em certo ponto a gente ri de nervoso das inconsistências, mas logo vira material de trabalho com pitada de humor sádico (não sou eu quem vou morrer de raiva, ah não!) de um louco que gargalha curvando-se pra trás, como quem sabe que nada dura para sempre e amanhã vai ser outro dia. E sabe lá Deus onde estarei na semana que vem.
☕ botando os papo em dia
É querides, esse dia chegou. 21 dias de escrita se encerra aqui e gostaria de agradecer a quem passou a me acompanhar conforme o tempo também passava. Quando comecei, idealizava escrever por 21 dias seguidos, desafio que o
proprõe para sua comunidade de escritores, mas logo me engajei num mochilão de volta pro Brasil e depois a vida foi simplesmente acontecendo na velocidade 5 da dança do créu.Apesar dos desafios, mantive a intenção da news e ela foi se desenhando mensalmente (na medida do possível) ao passo que também vinha entendendo o que era de fato ter um espaço para compartilhar meus pensamentos e vivências.
Tem sido uma escola, mas nada melhor que chegar no final da rua de um projeto querido, não é mesmo?
Vejo vocês na próxima esquina!
✨ as novidade, menina
Uns projetos finalizando e outro catatau de novidades batendo na porta!
Solta no pé de um vento escasso é o nome da próxima temporada de newsletter. Serão as sacudidas que vou dando nos pés de vento por aí afora.
Vencendo os desejos e as estatísticas, também se aproximam crônicas e contos de trips por naturezas exuberantes que fiz de diferentes maneiras nos últimos anos. Vai rolar lá pelo blog, entonces, se deseja acompanhar as aventuras, lá é o lugar!
🪁 gostin de quero mais
Mientras aguardam as novidades, dá um saque
no bonitinho do meu site e no catálogo de serviços - não sei se você sabe, mas também sou designer :)
se preferir, leia um romance soteropolitano
ou qualquer outro texto do blog
você também pode conhecer alguns projetos autorais com colagem analógica
Um xêro e nos lemos por aí!